MLUIZA |
Há dias ando lendo sobre Cajazeiras. Como toda essa região do Ceará limítrofe ao oeste da Paraíba, Ipaumirim e vários outros municípios, orbitamos em volta de Cajazeiras que foi definitivamente nosso modelo mais próximo de modernização. Depois, com as facilidades que foram surgindo ampliamos este foco para outras regiões. Tudo estava em Cajazeiras: os médicos, as novidades da moda, as revistas, o comercio, as emissoras de rádio, as festas, os carnavais e até os comícios de lá eram muito interessantes. Lembro que meu pai não perdia um comício da campanha de João Agripino para governador. Lotava o seu jipe e ia com toda a família, menos eu que estudando interna, em Cajazeiras, não podia sair de noite. Tinha que obedecer as rígidas regras do colégio. Eu ficava para não viver porque não podia ir. Sabe aquele sentimento adolescente de que ‘todo mundo vai, menos eu’? Quanta injustiça pode haver nesse mundo! Estudei interna no Nossa Senhora de Lourdes até 1967 quando as irmãs me despacharam, graças a Deus, por mau comportamento. Enfim, eu era malcriada demais e pouco afeita a rigorosa disciplina do colégio. Mamãe ficou muito decepcionada, mas, com certeza, o meu contentamento foi infinitamente maior do que a decepção dela. Foi a minha carta de alforria. De tanto ficar de castigo na pequena biblioteca do colégio, apurei meu gosto pela leitura. Tive colegas inesquecíveis que há muito não tenho contato. Parte delas, foram deportadas junto comigo, é claro. Éramos uma gangue de rebeldes. Graça Brasileiro, do Baixio, Graça Alencar, do Ouro Branco, Elizabeth e Hosana Soares, de Santa Helena, Ieda Pires de Sá, de Sousa, Mariinha, de Lavras, as meninas de Sousa e de São Gonçalo, entre outras, são as que lembro neste momento. Não posso desconhecer que aprendi muito nesse colégio apesar de discordar dos seus métodos. Em Recife, na década de 70, tive grandes amigos de Cajazeiras. Lembro particularmente dos irmãos Zélio e Luiz Humberto Furtado, gente muito fina com os quais eu perdi o contato. Outro dia, eu vi Zélio num restaurante. Ele olhou, eu olhei mas sei lá porque não nos aproximamos. Acredito que ele, como eu, ficou na dúvida se era ou não era. A fisionomia que o tempo altera tem o poder de promover essas dúvidas. Tolice, fiquei com pena porque não fui lá conferir e reencontrar o amigo. Ainda em Recife, tive contatos com outros estudantes de Cajazeiras que eram bem divertidos. Onde andarão?
Minhas lembranças, neste momento foram aguçadas, pelo livro que acabei de ler. ‘Portal da memória: um passeio pelo passado de Cajazeiras’, de Francelino Soares de Souza, que, por coincidência, foi meu professor – não lembro se de português ou francês - no Colégio Nossa Senhora de Lourdes. O livro é uma declaração de amor à Cajazeiras e eu gostei muito de revisitar, principalmente as décadas de 50 e 60, através das memórias do professor.
MLUIZA
Recife, 17.12.2020
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