AKI PENSANU: OBJETA NÃO IDENTIFICADA

MLUIZA

Sabe-se lá porquê eu encontro tanta gente estranha cruzando o meu caminho. Num local que eu frequento tem uma mulher que é um primor de pedantismo. Enquanto faço minhas atividades físicas me distraio imaginando, de acordo com sua aparência, um personagem pra ela num possível conto ficcional baseado no fabuloso mundo delirante da classe média metida a besta. A aparência física já está dada pela sua própria imagem e o perfil psicológico já está alinhavado. Com aquela pinta de macaca da extrema direita enfadada com a mediocridade da vida deslumbrada que leva, deve odiar pobre. Por favor, não fale em feminismo perto dela. Isso morde? Respeite, a objeta não é uma mulher, é solamente uma consumidora e isso já é muito para horizontes tão estreitos. Ela só entende de coluna social onde fica à espreita do seu grande sonho de um dia ser citada. Na falta disso, se satisfaz curtindo o mundo das subcelebridades que ela também não consegue ser. Detesta pisar no chão porque sonha com uma passarela e tem para caminhar apenas as calçadas e ruas esburacadas do Recife por onde passa todo mundo. Daí, para não enlouquecer de vez e não desistir da compra de um carro importado decide comprar cadeiras de plástico para sua casa. Afinal, o mundo não precisa ver o interior do seu lar. O carro é imprescindível para referendar-se socialmente. Sabe aquele tipo de loira à força que tem na faixa dos 60 anos, pinta o cabelo pra parecer que tem 50 e fica com cara de 70? Chega tão palidamente maquiada com seu rosto inexpressivo que eu ainda não consegui identificar se aquela aparência é uma transfiguração pleiadiana causada pelas técnicas de correção estética associadas ao botox ou se o produto que ela usa é uma máscara ou um reboco. Os seus rebentos devem ser do tipo fragilizado que não aguenta tranco sem ajuda de um tarja negra. Os netos, coitados, devem ser tratados com o celular do momento até que não conseguem resistir e são conduzidos aos consultórios fazendo a festa dos psicólogos especializados em transtornos emocionais infantojuvenis. Enquanto isso, o marido ganha cada vez mais dinheiro e ela leva cada vez mais chifres. Desolada, vai curtir a ressaca do desprezo afetivo-sexual viajando para os EUA. Esforçou-se para aprender o inglês suficiente para visitar os brinquedos da Disney e fazer compra de artigos chineses nos outlets de Miami cujos donos e funcionários são imigrantes latinos. Deve tirar muitas selfies que é bem melhor do que se olhar no espelho porque já não suporta conviver consigo mesma. A selfie , pelo menos, ela pode postar e receber um like piedoso das amigas.
MLUIZA
18.11.2019.

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