Hoje,
tratamos dos antigos engenhos de rapadura do município de Ipaumirim. O material
que ora publicamos não seria possível sem a generosidade de Jarismar Gonçalves
de Melo que nos disponibilizou as suas lembranças que compõem a essência do
texto. Registramos a importante colaboração de Diana Ribeiro, Federalina
Quaresma, Francisco Farias, Hegildo Holanda, José Ribeiro, Josenira Holanda,
Magna Gonçalves e Mércia Gonçalves. Este texto será complementado pela memória
das pessoas que tiveram vivência no contexto dos engenhos e que queiram
compartilha-las conosco. Este material está em constante ampliação e o blog
está aberto a qualquer pessoa que quiser participar da construção da memória de
Ipaumirim. Diferentes olhares só vão enriquecer o conjunto. A nossa proposta
não é ser uma vitrine laudatória mas abrir espaços para que as pessoas possam
contribuir com a memória do município.
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MLUIZA e JARISMAR GONÇALVES. Foto de Magna Gonçalves |
“Do
sertão sempre recordo,
Com
sordade marvada
Dum
ingem de pau moeno,
Com
sua guela ingasgada,
Num
cangote da boiada.
..
Bem
cedo, madrugadinha,
O
aboio do tangedô;
Atrepado
na manjarra,
Vai
inté o sol se pô,
E
aquele cantá bonito,
Atravessano
o infinito
Inté
no céu tem valô.
..
Ingém
veio trabaiano
Cum
curage, soluçano,
Musga
bonit cantano,
Alegre,
porém sardosa
Os
boi, coitado, sofreno
As
três moendas troceno
Cum
muita força ispremeno
Cana
fita e cana rosa.
...
Cuma
tu, ingem de pau,
Eu
também vivo moeno
As
canas do sefimento
As
socas da disvintura.
Qui só
dá pranto e disgosto
E faz
correr no meu rosto
A
garapa da amargura.
...
Meu
ingem veio manhoso!
Esse
teu cantá penoso
Gemeno
quando tu mói,
Fazendo
corrê na bica
Garapa
que tu constrói
Eu
cumparo a minha vida
Qui
também canta sentida
E faz
correr isprimida,
Água
sargada dos óios.
...
Tu, no
teu tacho freveno,
Faz o
mé, a rapadura
O
arfinim, a batida
E
muitas outas doçura.
...
Dessa
grande diferença
Já
todo mundo deu fé:
Eu só
faço pranto e dó
E tu,
seja cumo fô
Faz
rapadura e faz mé
...
Mas
nem pur isso ismoreço,
Vou
assim inté a morte
Cada
um disbuia a sina
Qui li
distinou a sorte
...
Pode
sê qui argum dia
Deus
qui é bom, num é mau,
Dissavessando
minha vida
Faça
dela um ingem de pau
...
Pra
mode muê vintura
Prazeê
e tranquilidade
Essa
cana abençoada
De
‘Sítio Filicidade’,
Pra
dssa garapa assim
Prepara
munto arfinim,
In
forma de coração,
Pra
mode eu dá de presente
A
essas crasses decente
As
muié do meu sertão.
(Otacilio
Pereira de Carvalho in FIGUEIREDO Filho, José de. Engenhos de rapadura do
cariri. 2010 pp. 48-49)
Não existem dados precisos de como as primeiras
sementes de cana chegaram na região do Cariri, se elas teriam vindo através de
Pernambuco com uma tradição canavieira desde Duarte Coelho e de longa tradição
comercial com o sul do Ceará ou do Recôncavo Baiano pelas correntes migratórias
vinda da Bahia ainda no processo de colonização e povoamento da região. Não se
sabe precisamente quando mas existem, entretanto, informações concretas sobre a
existência do plantio de cana no Cariri ainda no século XVIII.
“Muito antiga a lavra de cana de açúcar no vale
caririense, contemporâneo, pode-se dizer, de seu descobrimento.
Em 8 de setembro de 1738 concedeu o Capitão-mór
Domingos Simões Jardim a Francisco Pinto da Cruz registo de uma data de terras
por êle compradas no Riacho dos Porcos, com ‘Engenho de Canas e mais Lavouras.”
(PINHEIRO, Irineu, 2010, p. 37)
FIGUEREDO FILHO remete a João Brígido oferecendo
mais detalhes sobre o tema informando que em 1765 já existiam no Cariri 37
engenhos que fabricavam mel e rapadura. Ainda segundo o autor, o Dicionário
Geográfico Histórico e Descritivo do Ceará, 1939, registra mais de duzentos
engenhos no município do Crato. Em 1858, funcionavam 72 engenhos na região de
Barbalha.
A cultura de cana no Ceará começa com a cana
crioula que vem da Ilha da Madeira, em 1663, com Martim Afonso. Com ela
produzia-se uma boa rapadura, mas o lucro não era compensador. Animais
silvestres como a raposa e o guaxinim praticamente dizimaram as plantações.
Em 1810, a
cana crioula foi substituída pela cana Cayenna popularmente conhecida como Cana
Caiana. Dava uma boa rapadura, mas era muito
susceptível às pragas.
Em 1894, a cana caiana, principal cana cultivada no
Cariri, adoeceu de um mal na época não diagnosticado. Passou a ser importada, então,
a cana rosa, a amarela de Java, a fita roxa, a fita amarela e a Bourbon que
também foram acometidas da mesma moléstia. Chegaram então a cabocla, a roxa, a
semente ou flor de Cuba. A cana preta
que durante um certo tempo chegou a dominar os canaviais do Cariri mas acabou
sendo abandonada por conta da baixa qualidade da rapadura.
Por volta de 1925, o mosaico dizimou o canavial caririense. Quem salvou a crise
canavieira na região foi a cana P.O.J. introduzida na região através do Campo
de Sementes da Cana de Açúcar no Cariri, em Barbalha e distribuída entre os
plantadores em 1934. As principais variedades P.O.J. que se adaptaram na região
foram as de número 2714 e 2878. (História do cariri III, p. 110)
A variedade 2714 tinha um formidável rendimento
bruto e resistência às moléstias. A variedade 2878 era bastante resistência às
moléstias e um alto teor de sacarose.
“Essas sementes da P.O.J. vieram da Estação
Experimental de Campos, no Estado do Rio de Janeiro, para o Campo das Sementes
de Cereais e Legominosas de Guaiúba, no Ceará. Isso, por não haver ainda, na
época da importação, área preparada para recebe-las no Campo de Barbalha.
Transplantaram-se as sementes daquela localidade para o Cariri, em 1934”
(PINHEIRO, Irineu, op. cit. P. 58)
Em 1859, quando a Comissão Científica de Exploração
passa por Lavras faz o seguinte registro: “Lavras, à margem do rio Salgado, no
caminho para o Crato, era uma vila pequena e tristonha, com duas escolas
primárias e uma igreja sob a invocação de S. Vicente Férrer. No município, em
1858, havia 44 engenhos de madeira a fabricar açúcar e rapadura.” BRAGA, Renato
apud MACEDO, Joarivar. São Vicente de Lavras, 1984, p. 104.
É importante observar que os
engenhos de rapadura representaram uma das principais atividades agrícolas de
Lavras da Mangabeira que chegou a ter, nos meados do século XX, cerca de 115
engenhos atualmente desativados. Existia, portanto, no contexto desta região
uma tradição de cana movimentando a economia rural embora fosse menos
expressiva que a cultura do algodão.
O que nos interessa, no momento, não é a discussão
sobre a propriedade de terras em tempos tão remotos mas registrar que esta
área, independente do seu pertencimento, estava integrada ao contexto
canavieiro de Lavras. É a partir da criação do município de Ipaumirim que
poderemos recortá-lo como polo de cultura de cana do nosso município.
Jarismar Gonçalves traz-nos informações precisas
sobre este processo.
“A cultura da cana de açúcar na região do Sítio
Velho, atual Distrito de Canauna,
começou logo depois da seca de 1915. Assim acredito porque meu pai,
Alexandre Gonçalves da Silva, me contava que o seu pai, Manuel Antônio
Alexandre Gonçalves, faleceu muito novo, em 1915. Ele e os irmãos foram
trabalhar no engenho do seu tio, Miguel Alexandre Gonçalves, no Sítio Uma de
Gato, sendo esse o primeiro engenho daquela localidade. À princípio, plantavam
a cana caiana por ser a mais doce e produzir resultando uma rapadura mais
gostosa, no entanto, de pouco rendimento. Por esse motivo, passaram para a cana
piojota que existia nas variedades preta e roxa
de maior produtividade” (Jarismar Gonçalves, em depoimento)
Existem registros de engenhos de rapaduras na
região de Ipaumirim desde o século XIX mas
as terras lindeiras do Sítio Velho com as terras da Unha de Gato, foram
efetivamente o núcleo centralizador da cultura de cana do município e concentraram
um expressivo polo de produção de rapadura embora outros polos menores e engenhos dispersos houvessem no município.
Quando da definição do território do Distrito de
Canauna terras onde funcionavam outros engenhos foram referenciadas dentro da área do distrito embora nesta época os velhos engenhos já não
existissem, tais como Sítio Umburana e Sítio São Pedro.
Para melhor compreensão da sua distribuição
dividimos esses engenhos em três grupos.
No primeiro grupo estão os engenhos identificados
por Jarismar Gonçalves que ficam no perímetro original do circuito Unha de Gato/Barra/Sítio Velho. Enumeramos
pelo proprietário, localização e algumas informações que facilitem o
reconhecimento pelo leitor.
1. Miguel
Alexandre Gonçalves, Sítio Unha de Gato, proprietário de um dos primeiros
engenhos da região da Unha de Gato. Casado com sua sobrinha Maria Rosa Saraiva
de Araújo. Instalou-se posteriormente no município de Umari onde veio a
falecer.
2.
Antônio
Alexandre Gonçalves, Sítio Unha de Gato. Nascido em 1878, seu
engenho foi um dos primeiros da região movido a bois. Vale registar que Antônio
Alexandre teve dois engenhos. Além do engenho do Sítio Velho era também o dono
de um engenho na Unha de Gato. Quando adquiriu parte do Sítio Velho instalou no
local esse engenho que ora registramos. O seu antigo engenho na Unha de Gato
ficou para os filhos Luiz Antônio Gonçalves e Manu Gonçalves. Foi vereador pelo
município de Umari. Faleceu em setembro de 1954.
3.
Luiz
Antônio Gonçalves, Sítio Unha de Gato (tinha dois engenhos. Vide
as informações sobre seu pai, Antônio Alexandre Gonçalves). Casado com sua
prima Mariri, filha de Miguel Alexandre
4.
Alexandre
Gonçalves de Almeida, Sítio Unha de Gato. Filho de Maria Francisca
do Espírito Santo e Vicente Duarte de Almeida. Casado com Alzira Nogueira de
Almeida (Nenê).
5.
Manuel
Alexandre Gonçalves (Senhor Alexandre), Sítio Unha de Gato. Casado
com Dona Elvira, pais Nice e Nilton.
6.
Higino
Diniz, Sítio Cacimba do Meio. Nasceu no município de São Bento
na Paraiba e, 1916. Chegou a Ipaumirim na década de 40 casou com Maria
Gonçalves Diniz, primeira mulher eleita vereadora no municpio de Ipaumirim.
Vereador, foi presidente da Cãmara em várias legislaturas. Faleceu em março de
2001. (Bezerra, Hermes Pereira, Ipaumirim 60 anos. 2013. Pp 216-217)
7.
Florêncio
Gonçalves Torquato, Sítio Barra, posteriormente adquirido por Jarismar
Gonçalves de Melo que o modernizou. Este engenho pertenceu a Laurentina Maria da Conceição, nos anos 30, e ficou para Florêncio que era casado com uma de suas netas.
7)
Manoel
Gonçalves de Almeida (Nelo), Sítio Barra. Casado com
Louzinha.
8)
Antônio
Gonçalves da Silva, Sítio Barra. Casado com Dona Iaiá Torquato,
foi candidato a vice-prefeito de Ipaumirim na chapa de Jerônimo Jorge na
eleição de 1967 perdendo para Jose Fernandes de Sousa e Chagas Sarmento.
9)
José
de Melo e Silva, Sítio Velho. Líder do Sitio Velho que se
transformou posteriormente em Distrito de Canauna.(Vide post referentes a fundação
do Distrito de Canauna)
No
segundo grupo estão os engenhos informados pelo pesquisador
Hegildo Holanda que compartilhou conosco dados da sua pesquisa. Os engenhos
deste grupo referem-se aos engenhos existentes na década de 30. São engenhos
que ainda não havíamos identificados em nossa pesquisa original. Tentamos
complementar suas informações através de várias fontes. São eles:
10)
Gabriel
Alves Santana, Sítio Barra. Gabriel consta
como um dos proprietários do Sitio Barra/Unha de Gato no Recenseamento de 1920. O outro proprietário da
Barra registrado, neste recenseamento, chamava-se Antônio Ângelo de Mello que era marido de Laurentina Maria da Conceição que tem um outro engenho registrado em seu nome. Não temos informação se este engenho foi
desativado ou vendido.
11)
Raimundo
Correia Lima, Sítio Caititu. No recenseamento de 1920, esta
propriedade está registrada em nome de Pedro Antônio Crispim. Posteriormente,
teve como dono Honório Crispim, provavelmente seu herdeiro. Jarismar Gonçalves
informa que este que seria um dos mais antigos da região movido a caldeira.
12)
Maria
Esperança da Conceição, Sítio
Serrote Redondo. Até o momento, não
temos mais informações sobre esse engenho. No Recenseamento de 1920, não consta seu nome como proprietária de
terras.
13)
Vicente
Ferreira de Souza, Sítio Zé Vieira. Vicente Ferreira de
Sousa foi eleito vereador em Baixio nas eleições de 1954 e, depois, nos pleitos
de 1958, 1962, 1966. Em 1970 fica como suplente e seu nome não mais aparece nos
resultados eleitorais do TER-CE.
14)
José
Ferreira de Sousa, Serrote Redondo. No
Recenseamento de 1920, já consta seu nome como um dos donos das terras do
Serrote Redondo.
15)
Antônio
Sabino de Menezes, Sítio Cacimbão. No
Recenseamento de 1920, ele consta como um dos donos das terras do Sítio
Cacimbão.
16)
Laurentina
Maria da Conceição, Sítio Barra. No
Recenseamento de 1920, consta o nome de seu esposo, Antônio Ângelo de Mello,
como um dos proprietários das terras do Sítio Barra. Nascida em 1862 e falecida
em 1955, Laurentina doou o espaço e trabalhou para a construção da capela da
Barra ainda no século XIX. O seu engenho ficou com Florêncio Gonçalves Torquato.
17)
José
Josué da Costa, Sitio Novo.
18)
Hercolino
Gonçalves, Sítio Minador. Casado com Maria
Pires Rolim, não deixou filhos naturais mas teve vários filhos adotivos
inclusive sobrinhos. Maria era sobrinha da terceira esposa de Félix Antônio
Duarte, Josefa Rolim de Albuquerque. No Recenseamento de 1920, Hercolino consta
como um dos proprietários das terras do Sítio Olho d’água.
19)
Vicente
Germano dos Santos, Sítio Umburanas. estava
localizado entre a casa de Luiz Mariano, atual proprietário do sítio, e o
açude. Segundo Jarismar Gonçalves, Vicente Germano acabou com o engenho porque
a rapadura produzida era preta e não tinha comercialização apesar de suas
terras de cana serem muito boas. Com a criação do Distrito de Canauna, o Sitio
Umburana ficou referenciado na área do distrito.
20)
Matias
Duarte Passos, Sítio Melão. Paraibano, nasceu
em 1861 e faleceu em em 1925. Casado em segundas núpcias com Angelina Guedes
Rolim (Dosanjo) deixou vários filhos do primeiro e segundo casamento. Entre
eles, Chico Rolim que iniciou sua vida de aprendiz de comerciante no pequeno
comércio de Alagoinha. Posteriormente, foi prefeito de Cajazeiras e deputado
federal pelo Estado da Paraíba. No Recenseamento de 1920, Matias encontra-se
como um dos proprietários das terras do Sitio Melão.
21)
José
Saraiva de Araújo, Sítio Capoeira Grande.
No Recenseamento de 1920 está registrado como um dos donos das terras do Sítio
Capoeira Grande. Jarismar Gonçalves, este engenho teve
seu maquinário vendido a Antônio Gonçalves (Toinho Gonçalves) e Manuel Gonçalves
de Almeida (Nelo) que o instalaram no Sitio Barra. José Saraiva de Araújo foi candidato a
prefeito pela Arena 2 no pleito de 1970 mas perdeu a eleição para José
Fernandes de Sousa (Nildo Fernandes) , da Arena 1.
22)
Félix
Antônio Duarte, Sítio Olho d’água. Natural do
Sitio Melão, Félix Antônio comprou as
terras do Sitio Olho d’água pertencentes a Antonio Sucupira Cândido. Foi casado
três vezes. O primeiro casamento com
Maria José de Lima (Cotinha), natural de São José de Lavras, atual Distrito de
Mangabeira. Uma das filhas do casal, Joana Maria de Lima, Dondon, casou com
Vicente Felizardo Vieira, filho único de Bento Vieira e Joana Nunes Vieira que
dão origem a família Vieira do Distrito de Felizardo. Do segundo casamento, com Vitalina, não teve
filhos. Do terceiro com Josefa Rolim de Albuquerque, sobrinha de Padre Inácio
Rolim, de Cajazeiras, nasceram dois filhos:
José Nonato Rolim e Joaquim Félix Rolim. Félix Antonio foi vereador por
Umari em 1884 na Câmara Municipal de Lavras da Mangabeira, em 1883 e faleceu
por volta de 1900. (Em família pp. 15-18)
23)
Antônio
do Monte Pereira, Sitio Cajazeirinha. No
Recenseamento de 1920, Antônio consta como um dos donos das terras do sítio
Cajazeirinha.
24)
José
Félix de Morais, Sítio Serrote Redondo. Não
encontramos o registro do seu nome no Recenseamento de 1920.
25)
Luis
Ferreira Viana, Sítio Torto. Não
identificamos no Recensemaneto de 1920 nenhum proprietário e ou sítio com estes
nomes. Entretanto o Sítio Torto existe no município de Ipaumirim.
No
terceiro grupo estão os demais engenhos identificados ao longo do processo:
26)
Antônio
Raimundo Holanda, Sítio Bananeira.
27)
Avelino
Ribeiro Cisalpino, Sítio Serrote
28)
Cícero
Victor dos Santos, Sítio Alto Santo
29)
Luiz
Leite da Nóbrega, Sítio São Pedro. Nasceu em 1895 no sitio
Panelas, em Lavras da Mangabeira. Chegou em Alagoinha em 1919. Casou com Maria
Leite da Nóbrega, filha do Coronel Cazuza Santana e Ursulina Leite, oriundos de
São José do Egito. Luiz Nóbrega foi agricultor,
líder político na região, prefeito de Baixio e exerceu alguns cargos
públicos federais. Católico fervoroso, construiu com ajuda de amigos e da
comunidade da pequena cidade a capelinha
de São Sebastião no alto da pedra do mesmo nome criando condições para
consolidação da romaria de São Sebastião no município de Ipaumirim. Nasceu em
setembro de 1895, filho de Francisca Leite da Nóbrega, neta de Fideralina
Augusto Lima, e Jerônimo José da Nóbrega
oriundo da região de Patos – PB. Faleceu em 02.11.1960.
30)
Raimundo
Victor dos Santos, Sítio Novo.
Federalina Quaresma nos
informa mais um engenho no Distrito de Felizardo:
31)
Benevenuto
de Almeida Cavalcanti (Nutinho), Sítio
Carnaubinha. Filho de Marica e neto
de Félix Antonio Duarte, Nutinho foi casado com sua prima legítima Raimunda
Vieira Cavalcanti (Mundinha), filha de Vicente Felizardo e Dondon, todos
oriundos do Distrito de Felizardo. .
A maioria dos engenhos
(14) concentra-se originalmente na região de Canaúna, sete estão na região da
Bananeira e suas imediações, cinco no Distrito de Felizardo e os demais
distribuídos por outros sítios.
É possível que outros engenhos tenham
existido e não tenhamos registro até o momento, assim como alguns entre os que
registramos podem ter passado por outros donos, anterior ou posteriormente.
OS
ENGENHOS E SUAS NARRATIVAS
Os engenhos têm muitas narrativas e foram palco de
muitos acontecimentos no seu cotidiano. Alguns deles dramáticos e outros
curiosos.
O engenho da Cacimba do Meio, propriedade de Higino
Diniz, pertencia originalmente a Vicente Gonçalves, também conhecido como
Vicente de Sinhá, casado com Dona
Perpétua. Este casal migrou para o Crato porque o seu irmão, José do Abrão,
casado com Dona Maria Nunes oriunda do município de Aurora, foi assassinado por
um parente, João Gonçalves. A desavença foi ocasionada pela convergência de
vários fatores (cachaça, imaturidade, infidelidades e intrigas familiares entre
contraparentes) durante um samba realizado no Sítio Unha de Gato. Desde os tempos imemoriais, a ousadia das
mulheres transgressoras fazia estragos consideráveis.
Florêncio Gonçalves, dono de um engenho no Sítio
Barra, do ramo da família Gonçalves do município de Aurora, porém do mesmo
tronco familiar dos Gonçalves de Ipaumirim, foi assassinado porque queria fazer
uma estrada passando pelas terras de canavial pertencentes a uma sobrinha de
Dona Iaiá, esposa de Toinho Gonçalves. O
juiz da época, em Ipaumirim, Dr. José de Oliveira, mal informado sobre o
assunto provavelmente por não conhecer os meandros do problema e as querelas
familiares, conduziu de forma equivocada a questão que acabou no assassinato de
Florêncio por um rapaz chamado Roseno, noivo de uma sobrinha de Dona Iaiá. Com
o assassinato de Florêncio, a família migrou para Aurora. Durante algum tempo,
Chico Germano arrendou o engenho de Florêncio. Posteriormente, Jarismar
Gonçalves de Melo adquiriu a propriedade instalando um engenho mais moderno.
O engenho do Sítio São Pedro ficava nos fundos da
casa grande. A chaminé era instalada exatamente no quintal da casa onde também ficavam
dispostas compridas mesas cobertas de alvas toalhas. Sobre elas, as bacias de
goma onde as mulheres distribuídas à sua volta passavam as mãos para facilitar
o manuseio do alfenim. Ao lado da casa ficava o açude. Grande, bonito e
convidativo para o banho. A casa ficava cheia de visitas em tempo de moagem.
Certa vez, houve um burburinho no engenho quando os homens ficaram muito
inquietos por conta de algumas moças que tomavam banho de maiô no açude ao
lado. Foi preciso Luiz Nóbrega, meu avô, interferir e botar os homens para
dentro do engenho porque a admiração masculina poderia comprometer o mel do dia.
Quantas histórias têm esses engenhos para contar e
que ainda seria possível recuperar?
As informações a seguir se referem ao funcionamento
da economia da rapadura considerando a dinâmica das etapas de funcionamento dos
engenhos de rapadura da região original do Distrito de Canauna desde o plantio
até a comercialização.
PLANTIO DA CANA
“As terras boas ou más, são o fundamento principal
para ter hum engenho real e bom, ou máo rendimento. As que chamam massapês,
terras negras, e fortes, são as mais excelentes para a planta da cana.
Seguem-se atrás destas os salões, terra vermelha, capaz de poucos córtes;
porque logo enfraquece.” (ANTONIL, André João apud. FIGUEIREDO FILHO, J. de
Engenhos de rapadura do Cariri, 2010, p. 33)
As terras apropriadas para o plantio da cana para
produção de rapadura eram terras de baixio normalmente escuras. As terras estrumadas
eram ainda mais valorosas e, por conseguinte, mais caras. De uma maneira geral, as terras da cana eram
mais caras que as demais terras na região. Elas eram exclusivas para o cultivo
da cana não havendo associação, portanto, com outras culturas.
É interessante observar que nem toda cana boa
obrigatoriamente produz uma boa rapadura. É fundamental que haja uma relação
entre a variedade da cana e o tipo de solo. Quanto mais compatível essas duas
variáveis, maior a produção e melhor a rapadura. Em terreno bom e adequado, a
produtividade alcançava uma média de 60 cargas por hectare. Uma carga de cana
equivale a cem rapaduras.
A despesa com a cana era bem maior do que com
outras culturas, mas o rendimento era bem maior inclusive do que o algodão.
A preparação do canavial compreende as fases de
demarcação do terreno, preparação das covas, plantio propriamente dito, a
capina (limpeza) e a colheita.
O plantio demandava a limpeza do terreno. As covas
eram juntas, uma da outra, com profundidade de um palmo e meio. Durante todo o
inverno era necessário manter a limpeza do terreno. Os tratos culturais não
utilizavam agrotóxicos e/ou fertilizantes, o processo era basicamente natural.
Na época da colheita o corte era feito manualmente com um cutelo na base da
planta.
Não se considerava, na época, a questão do desgaste
do solo. Na preparação do terreno queimava-se a palha seca na própria área
plantada, procedimento este que contribuiria para maior fertilidade do solo.
A partir da preparação
inicial do solo eram praticadas sistematicamente as ‘limpas’ conforme a necessidade. As pragas
não eram muito comuns embora eventualmente se manifestasse a broca da cana de açúcar (Diatraea saccharalis), considerada uma das principais pragas da cana de açúcar mas
que também ataca outras gramíneas. A
broca nunca chegou a destruir totalmente os canaviais da região.
Eram necessários, pelo menos, 20 a 30 hectares
apropriados ao cultivo da cana para mover um engenho de rapadura. A produção
média por hectare era aproximadamente da ordem de 60 a 70 cargas de rapadura na
região de Canauna.
Um engenho de pequeno porte na região do Cariri produzia
cerca de 500 a 600 cargas de rapadura por safra plantada em área aproximada de
10 há de cana plantada.
O ENGENHO
O engenho normalmente se localizava perto da casa
grande. A sua construção era simples utilizando o tijolo comum produzido na região.
O conjunto do engenho não demandava técnicas especiais para sua construção. Apenas
a fornalha exigia habilidade e experiência. O pedreiro Antônio Alves de Melo e
os auxiliares Gelúbio Correia e Luiz Porfírio eram bastante conhecidos como conhecidos
construtores de engenho.
Jarismar Gonçalves conta-nos em detalhes o
processamento artesanal de produção da rapadura nos engenhos da região.
“Os primeiros engenhos da região eram tangidos a
boi, não existiam motores a óleo nem energia elétrica. A parte de cima do
engenho tinha uma bolandeira, ou seja, uma grande roda acima das moendas de
ferro sobre a qual existia uma manjarra, isto é, um pau parecido com uma linha
de casa fixado na madeira da bolandeira para amarrar as duas juntas de boi com
o fim de fazê-la rodar passando a cana entre as moendas. Cabia ao tangedor de
boi açoitar os animais para que eles caminhassem mais rápido e movimentasse com
mais rapidez as moendas onde o tranqueiro colocava o feixe de cana de onde saia
a garapa por um cano diretamente para um tanque grande de cimento ou ferro
conhecido como parol. Na parte baixa do prédio, os caldeireiros, pouco a pouco,
iam alimentando as caldeiras através de um cano chamado bica. O tangedor de boi,
com um ferrão e um relho, atiçava os animais para acelerar a velocidade e manter o ritmo do processo” (Jarismar
Gonçalves)
No período das moagens, de julho a dezembro, um
engenho funcionava diariamente com oito cortadores de cana, oito cambiteiros
que transportavam a cana em burros.
Na parte superior do engenho trabalhavam dois
tombadores, um tronqueiro que colocava a cana entre as moendas e um bagaceiro. Vale
salientar que existiam dois tipos de bagaceiros: o bagaceiro verde que passava
a cana nas moendas e o bagaceiro seco que levava o bagaço da cana para fornalha
onde seria queimado junto com a lenha. O bagaceiro seco trabalhava na parte
baixa da edificação onde também trabalhavam dois ou três caldeireiros, um
mestre de rapadura, um botador de fogo, dois caxiadores, e o foguista responsável por manter o fogo
aceso. Quando a garapa começava a esquentar, os caldeireiros iniciavam o
trabalho de limpar a garapa com as passadeiras. A garapa ia passando para o
tacho enquanto o mestre observava se o mel estaria apurado e limpo. O mestre de
rapadura e um dos caldeireiros colocava um pau roliço nas azeias do tacho
levando o mel para as gamelas. A partir daí começava o trabalho dos dois
caxiadores que utilizavam um tipo de pás pequenas para mexer o mel até o mesmo
endurecer e ser colocado nas caixas de rapadura. Depois de esfriadas, batem as
caixas e levam a rapadura para o armazém onde são disponibilizadas para a comercialização.
A mão de obra que movia diretamente o processo de
produção da rapadura num engenho rústico era exercida principalmente por homens
que executavam funções específicas: cambiteiros, tombadores, tronqueiros,
bagaceiro, foguista, caldeireiros, caixeadores
e mestre de rapadura sendo este fundamental em todo o processo.
FUNÇÕES DOS
TRABALHADORES NO PROCESSAMENTO ARTESANAL DA RAPADURA NUM ENGENHO RÚSTICO NO
MUNICÍPIO DE IPAUMIRIM-CE
ADMINISTRADOR – administra o processo produtivo.
Pode ser o dono do engenho ou alguém contratado.
BAGACEIRO SECO - Carrega o bagaço seco para
alimentar o fogo na fornalha.
BAGACEIRO VERDE - Passa a cana nas moendas.
CAIXEADOR - Enforma a rapadura e transportavam para
o armazém onde era vendida.
CALDEREIRO - Alimenta as caldeiras, limpa a garapa
e transfere o mel para as gamelas.
CAMBITEIRO - Transporta a cana da roça para o
engenho.
CORTADOR – Corta a cana.
FOGUISTA – Alimenta a fornalha.
MESTRE DE RAPADURA - Responsável pela qualidade da
rapadura, supervisionava o processo de produção.
TANGEDOR DE BOI - Açoita os animais para aumentar a
velocidade da moenda.
TOMBADOR - Tomba a cana junto do engenho.
TRONQUEIRO - Colocava o feixe de cana entre as
moendas
Um engenho padrão, na região, funcionava com oito
cortadores de cana, , oito cambiteiros , dois tombadores, um tronqueiro, um
bagaceiro, , um bagaceiro seco, dois ou três caldeireiros, um foguista, dois caIxiadores
e um mestre de rapadura.
O mestre de rapadura era o trabalhador mais importante
na hierarquia dos engenhos. Era uma categoria de prestigio detentora de
conhecimento especializado. Mantinha uma relação mais próxima ao dono do
engenho e tinha autoridade sobre os demais trabalhadores. A função despertava a
vontade e a ambição entre os que queriam alçar posições mais privilegiadas no âmbito
do engenho.
No contexto da cana existiam duas formas de
relações de trabalho: os moradores do próprio sítio e os contratados por
temporada.
Os moradores geralmente trabalhavam no plantio,
conservação da área plantada, corte e cambitagem. Durante a moagem este grupo ganhava
uma diária superior à que ganhavam nas atividades rotineiras do sítio.
O mestre de rapadura, o caldeireiro, o caxiador e o
foguista recebiam uma diária superior aos demais. Esta categoria podia absorver
trabalhadores do próprio sítio e ainda outros externos sendo que, neste último caso,
contratados por temporada, ou seja, por moagem.
Não existiam contratos formais de trabalho. Eram
acertos informais entre o dono do engenho e os trabalhadores. A remuneração centrada em diárias variava de
acordo com a função. A diária compreendia todas as tarefas da função sem
especificar atividades. Para a mesma função não havia diferença no valor pago
ao trabalhador interno ou externo, ou seja, entre o morador e o não morador do sítio
onde se localizava o engenho.
A jornada de trabalho começava entre três a quatro
horas da manhã e finalizava as seis da tarde. O engenho trabalhava cerca de
catorze a quinze horas de diárias. A parada para o almoço ocorria por volta das 11 horas da manhã por um
intervalo de mais ou menos uma hora. O ritmo do processo era trabalhar-comer- voltar
ao trabalho. No decorrer da jornada,
eles podiam comer rapadura e chupar cana para matar a fome, mas não podiam
interromper as atividades.
A jornada dos cortadores e cambiteiros iniciava
geralmente às quatro horas da manhã e terminava às quatro da tarde, quando
abasteciam o engenho finalizava a jornada. O tronqueiro e o tombeiro também
mantinham esse mesmo horário e a sua jornada terminava quando o tanque de
garapa estava cheio.
Quando o trabalhador necessitava cuidar de suas
lavouras precisava comunicar ao administrador do engenho e solicitar sua
liberação com antecedência.
Geralmente o trabalhador/morador era de gente de
confiança do dono do engenho, mas os trabalhadores de fora ocasionalmente
provocavam algum problema no desvio das rapaduras.
Todas as atividades relacionadas com o engenho eram
exclusivamente exercidas por homens. A participação feminina ocorria
exclusivamente na produção do alfenim. Parte das mulheres eram moradoras do
próprio sítio e outras eram de fora. Elas não recebiam diária, ganhavam por
produção. Em alguns engenhos, a renda do alfenin era da esposa do dono do
engenho.
A dinâmica do engenho comportava ainda contratos de
parceria que podiam acontecer basicamente sob duas condições:
a.
O meeiro plantava a
cana em sua própria terra e usava o engenho para processá-la. O dono do engenho
assumia as despesas de processamento. A produção de rapadura era dividida igualmente
entre os dois parceiros.
b.
O trabalhador cultivava
sua cana na terra do proprietário do engenho. Neste caso, a divisão da produção
de rapadura era realizada da seguinte maneira: em cada três cargas de rapadura,
o dono do engenho ficava com duas e o trabalhador com uma.
PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO
O engenho
gerava quatro produtos a partir da cana. Em ordem de importância: a rapadura,
principal produto, seguida do mel, da batida, alfenim e o melaço. Uma carga de
rapadura equivale a 100 rapaduras que poderiam pesar de 800 gramas q 1kg e o
preço variava de acordo com o peso.
O mel era
vendido por litro. Existiam diversos tamanhos de barril que transportavam o
mel.
Na produção da batida, o tempero era diferente da
rapadura. Feita com o mel do último tacho, ela é batida com uma pá e recebe
canela, cravo e erva doce.
Na produção do alfenim deixava-se o mel esfriar e
puxava-se com a mão até ficar alvo.
A rapadura e o mel também são bastante utilizados
na gastronomia regional nas cocadas, chouriço, como adoçante para coalhada,
consumida com farinha, com queijo entre outras iguarias.
O melaço, subproduto do processamento da cana,
popularmente conhecido como tiborna era utilizado na alimentação do gado.
A rapadura produzida na área de Canaúna era vendida
principalmente para o mercado local, para o Rio Grande do Norte, na região de
Pau dos Ferros, e para a região de Jaguaribe – CE. O alfenin, a
batida e o mel eram vendidos para o
Estado da Paraíba. O mercado da região jaguaribana estimulou a construção de
vários engenhos.
Não havia venda antecipada da produção. O comprador
só fechava o negócio conferindo a qualidade do produto e como a venda era em
grande quantidade, por carrada, geralmente era solicitado um prazo maior para o
pagamento.
MODERNIZAÇÃO
DOS ENGENHOS
Os engenhos movidos a diesel foram instalados a
partir dos anos 50. No início dos anos 60 José de
Melo e Silva compra, em Recife, por intermédio do seu amigo Luiz Pinheiro
Barbosa, novas máquinas a diesel para
mover o seu engenho.
Com a chegada eletrificação rural, em Lavras da
Mangabeira, nos anos 70, partir da
eletrificação rural nos anos 70, Luiz Augusto Lima, proprietário de engenho
naquele município, incentiva os seus vizinhos da região de Canauna a utilizarem esta fonte de energia a partir
de então disponível. O processo foi encaminhado
e os engenhos passaram a utilizar a energia elétrica. Os engenhos
pioneiros nessa iniciativa foram o engenho de Antônio Gonçalves, o de Jarismar
Gonçalves e o de Higino Diniz.
A modernização dos engenhos aumentou
consideravelmente a produção diária de rapaduras e demandou um . redimensionamento
das funções. O tangedor de boi foi extinto e o trabalhador passou a exercer
outra função. Aumentou o número de caldeireiros e dos que mexiam o mel.
As rodovias melhoraram o acesso ampliando os
mercados tanto nas zonas mais próximas quanto abrindo novas possibilidades
ainda que num contexto bastante limitado sem condições de concorrer com grandes
produtores da região do Cariri.
Uma carga de rapadura continha 100 unidades com
peso médio entre 800gr a 01kg. O preço variava conforme o peso. O mel era
vendido por litro.
O OCASO DOS
ENGENHOS
Entre outros, dois problemas consideráveis abalou o
mercado de rapadura na região. A produção local era bastante espelhada no
Cariri que era muito mais arrojada, com
maiores condições e mais capital. A produção local buscava entrar naquela
região e adotava procedimentos similares na tentativa de ampliar seu mercado
consumidor. Quando os engenhos do Cariri inseriram açúcar na rapadura para
deixa-la numa tonalidade mais clara, os produtores locais tentaram aplicar a
mudança na sua produção artesanal. Com a introdução do açúcar, a rapadura
ficava mais clara porém mais dura e o consumidor não gostou da mudança
provocando uma crise no mercado.
As alterações no produto para alcançar novos
mercados como, por exemplo, a produção de rapadurinhas de açúcar de diversos
sabores: leite, goiaba, etc. não surtiram o efeito esperado..
Entretanto, o principal problema da comercialização
da rapadura foi a queda na produção do algodão, principal mercado consumidor do
produto. Para o trabalhador rural, a
rapadura era um alimento por excelência utilizado nos seus hábitos
alimentares em casa e/ou no trabalho.
Além do seu poder nutritivo, ela podia ser transportada facilmente, era fácil
de armazenar e adequada para o uso individual.
Os engenhos foram, aos poucos, perdendo o vigor.
Atualmente, na região, em dois engenhos, no Riacho do Rosário, município de
Lavras de Mangabeira, ainda se produz rapadura de boa qualidade.
Alguns engenhos buscaram outras alternativas de
sobrevivência através da produção de melaço para ser utilizado na alimentação
do gado leiteiro presumindo-se que isto aumentaria a produção de leite.
Os resultados não tiveram o êxito esperado.
Outras questões, ainda, podem ser consideradas a partir de uma
perspectiva mais ampla de compreensão do problema da desvalorização da
rapadura. Entre outros, a alteração da dieta alimentar com a introdução do
açúcar refinado na alimentação contando para isso o acesso à mídia e, por
conseguinte, a novas receitas culinárias e a publicidade como suporte. Os
engenhos não conseguiram competir por total incapacidade de utilizar novas tecnologias
de produção que impuseram novas dinâmicas ao mercado cada vez mais competitivo
e cujo padrão de exigência demandavam altos investimentos e a capacitação de
mão de obra.
Os donos de engenho diante de um cenário que não
lhes favorecia foram perdendo a motivação e foram fechando aos poucos
principalmente na década de 70.
Parte dos trabalhadores da cana foram convertidos
em migrantes temporários que trabalham sazonalmente no corte de cana nas épocas
de safra no interior de São Paulo.
Os antigos engenhos de rapadura transformaram-se em
velhas construções que resistem apenas como testemunhas de um tempo.
“Olhava eu o
meu avô como se fosse ele o engenho. A grandeza da terra era a sua grandeza.
Fixara-se em mim a certeza de que o mundo inteiro estava ali dentro. Não podia
haver nada que não fosse do meu avô.” (Jose Lins do Rego. Meus verdes anos.
Memória.)
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MLUIZA
RECIFE
28.07.2019.