Faz tempo eu li em algum lugar - não lembro onde -
alguma coisa que dizia que, em política, vencem os sobreviventes, os que
conseguem resistir a todo tipo de imoralidade, sacanagem e falta de escrúpulos.
As regras são implícitas porém claras. Não há
limites. Entre "o céu e o creu", na política, cabe tudo. E só nesta
perspectiva é que se pode entender o retrocesso da pauta das campanhas. Retrocesso,
aliás, referendado por largas camadas da nossa sociedade, residente e
domiciliada no território brasileiro, conhecida cotidianamente como
consumidores e, nas eleições, promovidas à condição de eleitor. É o único
momento em que a grande maioria é vista como absolutamente igual, uma presa
disponível aos urubus à caça de votos. Tudo bem, é a regra. Ruim com voto, pior
sem ele. E sabemos direitinho compartilhar o jogo de mentiras, promessas,
negociatas!
Uma coisa é boa no meio de tanta lama: temos a
oportunidade de mostrar exatamente o que somos e o que gostaríamos de ser:
iguais aos nossos candidatos. Só assim se consegue entender como uma campanha
pautada no falso moralismo, no preconceito e na intolerância consegue comover a
sociedade, arrancar votos e nos remeter aos velhos tempos que pensávamos haver
deixado para trás.
A questão do aborto é uma pauta que vem sendo
colocada pelo cotidiano mas todo mundo faz de conta que não existe. No discurso
político, o falso moralismo faz uma releitura reducionista, explora o
antagonismo das posições extremas, passa ao largo das questões que realmente
interessam ao universo feminino e ao que se entende como responsabilidade do
poder público na proteção da família, do menor e da sociedade. Eita discurso
cansado! Mas tem quem goste. E como!
O texto de Maria Rita Kehl, publicado no jornal O
Estado de São Paulo e reproduzido aqui no blog, é uma aula de como se expressa
o preconceito social em nosso país. Não suportamos saber que precisamos
aprender a dialogar em outras bases com os mais humildes que saíram do pântano
da miséria total e subiram um degrau. Só um degrauzinho, nada mais, ainda estão
até com os pés sujos mas como isso incomoda. Acostumados que somos a olhar o
mundo do andar de cima, essa nova experiência é traumática. Dói saber que
mudamos muito pouco e que dolorosamente temos que aguentar novos companheiros
no nosso mundinho dos cartões de crédito, das desconfortáveis viagens de avião
na classe econômica e otras cositas más. Mas o que desmorona as nossas
esperanças de que um dia as coisas podem mudar é ver que a única pauta que a
política nos coloca é a ampliação do acesso a bens e serviços de consumo.
Quando propõe horizontes tão estreitos, acirra mais ainda o preconceito em
todas suas representações.
O fato dos jornais não noticiarem a maioria de
Tiririca não apenas em bairros pobres e habitados por nordestinos em São Paulo
é uma expressão do preconceito. Mesmo como um voto polêmico, muita gente se
sentiria mais confortável se Tiririca fosse mais votado apenas entre os seus
pares. É duro ser igual.
E se o preconceito e a intolerância tem sido o mote
das campanhas é porque assim somos. O marketing não arriscaria um apelo além da
nossa compreensão.
MLUIZA
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