Hoje, resolvi quebrar a rotina mais uma vez. Depois
de um tempo - o livro foi lançado ano passado - consegui fazer o download do
livro Direito à memória e à verdade e fiquei a semana santa
folheando o livro e lendo as lutas de um tempo que a minha geração viveu. De
uma maneira ou de outra, quem estava na universidade naquele período conheceu
tempos sombrios.
Vindos do interior para estudar na capital, eu e
muitos companheiros, tínhamos o peso e a responsabilidade de nos formar como
uma resposta aos esforços dos nossos pais. Não pertencíamos a grupos políticos
e nem tínhamos relacionamento com a subversão mas era aquele peso que pairava
sobre a cabeça de todos. Muito medo.
Participamos de uma universidade amordaçada de onde
tantos outros jovens, como nós, foram retirados por acreditarem no seu ideal
político. Eu estudava na Universidade Católica de Pernambuco e na Universidade
Federal de Pernambuco. Lembro que na Unicap apareceram uns garotos pedantes do
CPOR cuja boçalidade afastava todos os colegas. Estavam sempre sozinhos,
tripudiando de todos nas salas de aula. Era milico por todo lado travestido de
civil. Já sabíamos que não se podia falar em política.
Uma vez, viajando com um colega que trazia dois
sobrinhos pequenos, de repente, ele abre a carteira, esvazia pela janela do
ônibus e me pede para levar os sobrinhos se algo lhe acontecesse. Passamos a
viagem em pânico. Tive ainda duas amigas que se apaixonaram por militantes do
VAR Palmares. Foram presas no quartel de Campina Grande, apanharam e foram
trazidas para Recife. Nós que já estávamos em Recife para fazer as provas do
vestibular, não entendíamos porque elas faltaram a prova. Tempos depois,
soubemos que na pensão onde morávamos tinha um agente que as acompanhava. Uma
delas casou e ainda hoje vive com o mesmo marido diante do qual ela foi barbaramente
torturada. Mulher de fibra. Inteligente e decidida, tinha um pequeno e discreto
emprego no comércio porque precisava sobreviver e não conseguia outra coisa. A
outra também sobreviveu, mas nela a tortura psicológica causou maior estrago.
Nunca soube o nome verdadeiro do rapaz pelo qual estava apaixonada. Namoro de
jovem sem comprometimentos políticos que terminou com ela, sem roupa, no pátio
de um quartel, humilhada diante de soldados, alguns conhecidos porque Campina
Grande ainda era uma cidade pequena além do seu irmão ser um jovem militar de
baixa patente. Presume-se que o rapaz foi assassinado, mas nunca mais a vi. Com
essas e tantas outras pessoas convivemos.
Colegas dedo duro, medo e pavor de quem estava do
lado. Quantos colegas soubemos depois que eram agentes infiltrados, gente que
melhorou de vida na delação de outros jovens que nem sequer tinham alianças ou
envolvimentos políticos. O livro faz reviver um tempo que o Brasil não deve
esquecer. Tempos que o medo e a repressão permitiu acabar com saudáveis
discussões políticas e que formaram essa geração de pelegos e corruptos que de
uma outra forma continuam fazendo outras barbaridades.
Quem
quiser ler o livro pode fazer o download no site do Movimento Nacional de
Direitos Humanos (http://www.mndh.org.br/)
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