DESESPERAR, JAMAIS!

 

MLUIZA

Gordo, atarracado, barrigudo, idade mediana, óculos de grau, cabeleira encanecida, apartamento próprio, carro novo e sozinho. Esquisitice era seu principal atributo. Com a perda da mãe a vida perdeu o sentido. Tomou por amigos e confidentes os vigias noturnos, os flanelinhas de bares e quem mais que eventualmente lhe dirigisse um simples boa noite, Vivia pelos cantos, amuado, lamentando o desamor. Chorava desavergonhadamente sua solidão. Queria um amigo para conversar, ir ao futebol, fazer qualquer coisa. Não tinha. Ninguém o suportava.

Um dia resolveu buscar uma namorada. Ninguém o quis. Nem as donzelas nem as putas. Tachou as mulheres da capital de interesseiras e amorais. Seu carro novo, seu apartamento e seu salário não conseguiram demolir a rejeição feminina. Impôs-se um desafio. Quero uma mulher seja como for. Sem exigência. O que vier tá bom. Qualquer coisa é melhor que a solidão. Virou um bandeirante, um garimpeiro em busca de uma pepita de amor.

Resolveu aventurar-se pelo interior pernambucano em busca de uma namorada. Mapeou por região e fez o roteiro. A cada fim de semana uma cidade diferente. Quando as cidades eram próximas, fazia as duas praças.

Pensou no litoral mas não dava para competir com turistas descolados. Resolveu desbravar a partir da Mata Norte. Percorreu Carpina, Timbaúba, Aliança, Gloria do Goitá e Nazaré da Mata. Ninguém. Decepcionado nem tentou a Mata Sul. Arriscou-se pelo agreste. Buscou cidades menores, talvez nos lugares com menos oportunidades tivesse alguma mulher nem que fosse interesseira. Gastou um mês nesta empreitada. Passou por Venturosa, Caetés, Saloá e Tupanatinga. Nada. Resolveu passar por Aguas Belas. Incorporou Caramuru em busca de uma provável Paraguaçu fulni ô. Quem sabe, talvez, sei lá... vai que dá certo. Sorte é sorte. Nada!

Achou-se desordenado na busca. Entranhou-se pelo sertão. Segundo seu lema, quanto maior a cidade mais sabida são as mulheres. Estabeleceu um novo critério. Resolveu guiar-se pela demografia. Quanto maior a população feminina mais oportunidades. Assim sendo, verificou os dados demográficos e descartou o Sertão do Moxotó. Por intuição, desistiu de Salgueiro e Araripina.

Mudou o critério. Nada de região nem de demografia. Vou na linha do ’ó’. Danou-se para Bodocó, Cabrobó, Orocó e Orobó. Deu um up na autoestima, acreditou-se o ‘ó do borogodó’ e partiu. Agora vai. Não foi.

Arriscou o Pajeú. Escolheu a pequena cidade de Solidão. Calculou: se 1+1=2 então solidão + Solidão deve dar em alguma coisa. Companhia, por exemplo. Deu solidão². Acertou no cálculo e errou no raciocínio. Não deu.

Voltou pra Recife descabriado. Passou a semana planejando o sertão do São Francisco. Quem sabe uma sereia carente. Comprou um calção novo que disfarçasse o barrigão. Quem sabe na beira do rio... O rio não foi receptivo. Nadou no seco.

Decepcionado, resolveu investir no sertão da Paraíba. Partiu em destino dos Cariris Velhos. Cruzou a fronteira de Pernambuco passando por Sertânia e entrou na Paraíba por Monteiro. Passou por Sumé e foi bater em Santa Luzia dos Grudes. Garfou uma morena brejeira. Trouxe para Recife. Uma semana depois ela sentiu saudades. Decidiu voltar pra casa. Ele levou-a de volta pensando em convencê-la. Não deu. Ela preferiu a imponência dos paredões de pedra da região. E como já estava na rota, ele estirou a viagem até Pombal e trouxe uma doceira. Quinze dias depois ela argumentou que precisava voltar porque não podia perder a freguesia de doces.

De qualquer maneira, na Paraíba, pelo menos, tinha mulher disposta a arriscar. Isso já era alguma coisa. Olhou o mapa e descobriu Cacimba da Areia, perto de Patos. Conseguiu uma grávida. Encarnou Natanael, o célebre morador de rua descoberto por Gugu Liberato que lhe devolveu de volta ao Recife com direito a casa decorada e noiva grávida - ninguém sabe de quem. A casinha mobiliada era uma fofura. Tinha até quarto de bebê.

- Por que não comigo?, perguntou-se.

Trouxe a moça pra Recife. Fez o enxoval completo, pagou o pré-natal. Sentiu-se pai. Agora, sim, tinha uma família. Ela resolveu parir em Patos, levou o enxoval, os exames de ultrassonografia e inclusive o berço primorosamente escolhido por ela mesma. Ele pagou tudo. Teve o menino e lhe disse que não dava certo criar o filho em Recife porque era uma cidade perigosa. Vitimizou-se. Chorou.

No desespero da solteirice abandonada decidiu apostar nas festas juninas de Arcoverde. Afinal, tem mulher de todo canto no São João de lá. Tentou uma forrozeira. Deu certo. Voltou com o pacote completo. Mulher, filho adolescente, cachorro e gato. Apresentou orgulhosamente sua trupe aos habitantes do edifício onde mora.

Embora vez por outra esculhambe com ela na portaria do prédio por conta das despesas ainda assim continuam juntos.

MLUIZA

Recife, 9.08.2021

EDMILSON QUIRINO DE ALCÂNTARA: A LEMBRANÇA ALEGRE DE QUEM TEM APREÇO PELO TRABALHO QUE REALIZA.

Conversar com Edmilson é sempre muito agradável. Apesar da memória já comprometida ele adora falar sobre sua experiência como dono de bar....